Exmos
Integrantes da Comissão de Honra
Exmos
Componentes da lista A
Distintos
Convidados e Membros da AACDN
Minhas
Senhoras e meus Senhores
Começo
por agradecer o convite para intervir nesta sessão de lançamento da candidatura
da Lista A, felicitando, desde já, a escolha do Tema adoptado: “Defender e
Consolidar a Portugalidade, na senda da Ética, dos Valores e do Conhecimento”, por
considerar que a sua actualidade e a necessidade de reflexão sobre o mesmo, não
poderiam ser mais oportunas.
Permitam-me,
assim, que conduza algumas reflexões, tendo por base o Tema, olhando a nossa
história numa perspectiva estratégica em termos de grandes opções políticas e,
a partir daí, tecer algumas considerações sobre os desafios da actualidade.
Seria, aliás, muito difícil abordar a Portugalidade e os desafios com que nos
confrontamos, sem particularizar os problemas que se nos colocam e a realidade
da conjuntura estratégica actual que enfrentamos.
Somos
felizmente uma Nação que se confunde com o Estado, coincidência que alguns por
vezes pretendem perturbar, exacerbando diferenças mais de cariz folclórico do
que qualquer outro e esquecendo uma História de quase nove séculos, ao longo da
qual houve sempre necessidade de clarividência do ponto de vista estratégico para
garantir a sobrevivência como entidade política autónoma, procurando a sua
afirmação no contexto regional e internacional, através da coesão interna e de
grandes realizações.
Quando
se observa a nossa História, é possível identificar momentos, opções e objectivos
estratégicos, determinantes para a vida do nosso povo e para o país, como
entidade política autónoma e soberana.
A
Portugalidade afirmou a sua autonomia e a identidade nacional em 1143, na
conferência de Zamora e com o posterior reconhecimento papal, em 1179. Durante
o século XII fundou-se a Monarquia, alargou-se o território para sul e
conquista-se Lisboa em 1147. O século XIII consolida os fundamentos da nossa
identidade nacional; têm lugar os primeiros progressos e lutas sociais; a
monarquia triunfa apoiada nas forças populares contra o poder dos nobres; a
burocracia do Estado desenvolve-se e ganham influência os juristas que
estudaram o direito romano.
No século XIV os portugueses defendem a
identidade nacional e a soberania do território em Atoleiros, em Aljubarrota e,
também, em Lisboa. O
século XV afirma a projecção atlântica, a aventura africana, o dobrar do Cabo
Bojador, o Tratado de Tordesilhas, a posse do Brasil e a chegada à Índia,
consumou-se, assim, na afirmação de Arnold Toynbee, a primeira globalização.
Os
séculos XVI e XVII trazem-nos o apogeu Manuelino, o domínio espanhol e a
reacção portuguesa com a Restauração e a sobrevivência do Estado; os Lusíadas
cantam a gesta nacional; em 1578, em Alcácer Quibir , morre D. Sebastião e é destruído
o exército; em 1 de Dezembro de 1640, recupera-se a independência de Portugal e,
em1663, quando um exército espanhol entrou em Évora e se dirigia para Lisboa, a
população da capital alistou-se em massa para a contra ofensiva, que terminou
pela vitória do Ameixial; no Brasil e em Angola foram brasileiros e portugueses,
aliados aos índios e nativos, que expulsaram os holandeses e afirmaram a
Portugalidade.
Durante
os séculos XVIII e XIX faz-se a reforma da Universidade, são modernizadas as
estruturas administrativas e jurídicas, responde-se às consequências do
terramoto de 1775 e, quatro anos depois, é criada a Academia das Ciências; a
Família Real parte para o Brasil e em Portugal, portugueses e ingleses derrotam
três invasões francesas, o Brasil torna-se independente, assiste-se a duas
guerras civis, uma em 1832-34 e outra em 1846-47, a revolta da Maria da Fonte,
prolongada pela Patuleia. É extinta a escravatura, impulsiona-se a expansão em África,
desenha-se o Mapa Cor-de-Rosa e o país é confrontado com o Ultimato inglês de
1890.
Chegamos
à actualidade. O século XX traz-nos a implantação da República, a criação das
Universidades de Lisboa e do Porto, a participação na I GM, o Estado Novo, a
adesão à EFTA, ONU e à OTAN, a invasão da Índia e a Guerra em África; em 25 de
Abril de 1974, afirma-se o Portugal democrático, que abraça e adere ao projecto
europeu, ao espaço Shengan e ao Euro; cria-se o espaço lusófono materializado
na CPLP, apoia-se a independência de Timor, o território de Macau integra-se na
China e procura-se o desenvolvimento e a modernidade do país.
E
hoje? O país está confrontado com uma profunda crise económica e financeira,
repete-se mais um plano internacional de assistência financeira e interrogamo-nos
quanto ao futuro. Como atingir os grandes desígnios estratégicos que norteiam
as entidades políticas modernas, no primeiro mundo, a que Portugal quer
continuar a pertencer – a Segurança, o Bem-Estar e a Justiça Social.
Este
é um debate e uma reflexão estratégica, para o qual esta Associação está bem apetrechada
e motivada. Refiro aqui os princípios que esta Lista abraçou, como pilares da
sua candidatura e desenvolvimento do seu programa de acção, a par do
conhecimento da temática da Defesa Nacional e da Segurança, que está na génese
da sua constituição.
Este
é um debate e uma reflexão estratégica de que ninguém está dispensado, tanto
mais que está em elaboração um novo Conceito Estratégico de Segurança e Defesa
Nacional, para o qual o IDN apresentou as Bases Gerais. Se em relação ao Bem-Estar
e à Justiça Social, a Boa Governação e o Desenvolvimento constituem a resposta
determinante, relativamente à Segurança, espera-se do Governo uma atitude
esclarecida, responsável, espírito e vontade de Defesa Nacional, percepção dos
riscos e das ameaças e uma clara definição dos objectivos a atingir e a
salvaguardar, neste domínio.
Importa
reconhecer que o planeamento estratégico de defesa é hoje fortemente
influenciado pelas consequências da crise financeira, constituindo muitas vezes
também o factor determinante na definição dos objectivos estratégicos de defesa
e não os potenciais riscos e ameaças.
Deve
recordar-se que a economia necessita de segurança para progredir e
consolidar-se e que a segurança decorre também de capacidades militares, não apenas
para proteger a soberania, contra eventuais ameaças, mas também para participar
na preservação da paz e estabilidade internacional, designadamente na prevenção
e na gestão de crises.
A
Segurança tem hoje um conceito amplo com uma vertente psicológica onde
intervêm, de forma sinérgica e supletiva, as Forças Armadas a quem cabe a
defesa militar, as Forças de Segurança Interna que têm como atribuição as
acções de polícia e os agentes de Protecção Civil, com a responsabilidade das
acções de protecção e socorro das populações.
É
necessária uma cultura de Segurança e Defesa que privilegie os valores e os
princípios éticos que colocam a prioridade no interesse nacional e as pessoas,
a segurança humana, que amplie a cooperação entre os Estados e as Organizações
Internacionais a segurança cooperativa; é uma cultura que tem por base a
transparência, o conhecimento, a cultura e a cooperação.
O
mundo de hoje ultrapassou os limites da distância e do tempo, tornando
acessível a informação em tempo real, recurso estratégico na actual conjuntura
com uma característica diversa dos recursos estratégicos até agora conhecidos,
raros e finitos; a informação actual é abrangente e quanto mais se utiliza mais
se amplia, constituindo a base do conhecimento e da inovação.
No
caso das Forças Armadas, instrumento determinante da vontade de defesa e do
emprego da coacção militar, esquecer a sua missão principal, a defesa militar
da Pátria, privilegiando as missões de interesse público, é uma escolha
redutora das suas capacidades, mais cara e que, em última análise, afecta a
soberania.
Em
matéria de defesa, em termos nacionais, a procura de economias e a afirmação de
reformas têm conduzido a reduções de efectivos, atrasos em programas de reequipamento
estruturantes, constrangimentos no funcionamento da instituição militar e para
o exercício das competências das chefias, a par de um protagonismo do
ministério das finanças em matéria de defesa, que se pode caracterizar por três
palavras – Ignorância, Indiferença e Insensibilidade.
Igualmente
redutor é não reconhecer a condição militar e tratar as Forças Armadas no
quadro da gestão do Funcionalismo Público, aplicando-lhes os mesmos critérios
de funcionamento, de desenvolvimento de carreiras e mecanismos de controlo e
contenção, ignorando a sua estrutura profundamente hierarquizada, o ambiente de
disciplina inerente, a disponibilidade e o risco das missões atribuídas. A
intenção de aplicação directa e quantitativa do PRACE à estrutura das Forças
Armadas, sem atender à sua especificidade organizativa, é contribuir ‘para a
sua inoperância e ineficácia.
Sobre
a crise e as economias em matéria de defesa, permitam-me que cite o SG da OTAN,
em Munique no final de 2011: “as preocupações da Aliança não são com a economia
mundial, mas sim com a nova ordem mundial e temos de prevenir que a crise
financeira não se transforme numa crise de segurança”
Estamos
perante um mundo marcado por um arco de instabilidade que se estende pelo Norte
de Africa, se prolonga pelo Médio Oriente e pelo Sudoeste da Ásia, a par do terrorismo
transnacional; assistimos à proliferação da tecnologia que permite o acesso aos
mísseis balísticos e às armas de destruição maciça, atitudes do Irão e da
Coreia do Norte e temos dúvidas quanto ao potencial comportamento futuro, de grandes
poderes como a China e a Índia.
É
uma utopia e uma perigosa ingenuidade considerar que, em termos de defesa é
possível, dentro da Aliança Atlântica, haver uma divisão de trabalho
estratégico, com os EUA a fornecerem o “ hard power” e os europeus o “soft
power”, como o treino, a construção das instituições e a reforma do sector da
defesa, sem que isso mine a coesão da OTAN e a solidariedade transatlântica.
Vivemos
numa Europa que parece esquecer a solidariedade, que demonstra uma excessiva
dependência militar dos Estados Unidos, uma liderança política hesitante e
centrada numa rigidez e inflexibilidade germânica, uma agitação social que
progride nos países dos sul, mas que não se confina aí e que leva o centro
europeu a dizer: “a miséria de Atenas, Lisboa e Dublin, começa a ver-se nas
ruas de Madrid e de Roma e os receios do caos estão a chegar a Paris e a
Amesterdão”.
No
actual contexto de crise, a construção europeia debate-se com a discussão entre
os exigentes planos de austeridade motivados pela assistência financeira a
alguns países e a sua recessão económica e a necessidade urgente de medidas que
favoreçam o crescimento, o emprego e o abrandamento dos sacrifícios; um diálogo
de surdos que pode conduzir, no extremo, ao colapso do Euro e à desintegração
política da União Europeia.
Uma
Europa enfraquecida, dividida e com diferentes visões acerca da construção e
futuro da União, não são boas notícias para a estabilidade internacional, para
o desenvolvimento, para a credibilidade da OTAN e para o relacionamento com os
EUA.
Em
termos nacionais, somos um país que ao longo da História nunca se limitou ao
ambiente estratégico regional, sempre nos abrimos ao mundo e quisemos ser
intervenientes, participando nas grandes construções internacionais, políticas,
caso da OSCE e do Conselho da Europa, económicas e militares. Mas hoje é também
inequívoco que nesses “fora”, se espera que os participantes não sejam apenas
co-autores das decisões, sejam também co-responsáveis pela sua aplicação e
pelas suas consequências.
Essa
co-responsabilização traduz-se de forma cumulativa na solidariedade política,
no “burden sharing” dos encargos e na disponibilidade para cometer no terreno
forças militares em
operações. Neste ambiente estratégico, a disponibilidade de
um instrumento militar credível, capaz de ser empregue nos grandes
acontecimentos da paz e da estabilidade internacional, constitui um
investimento na liberdade de decisão política do estado, que lhe permite
decidir participar, ou não, por razões políticas e não por manifesta
incapacidade militar para o fazer.
O
país vive uma situação em que sente que a sua soberania está condicionada por
uma entidade difusa, que dá pelo nome de “troika”, confronta-se com um
sentimento de injustiça, que decorre de uma percepção de falta de equidade na
atribuição dos sacrifícios, sofre com o aumento do desemprego e com o corte dos
apoios sociais designadamente na saúde e tem dúvidas quanto à eficácia das
soluções propostas, para a efectiva e necessária recuperação económica.
Defender
a Portugalidade é assim pugnar pela adopção de opções estratégicas, que
favoreçam o desenvolvimento e a recuperação económica, que mantenham o país
como parceiro internacional credível, como actor da cena internacional em que
os atributos do Estado se exercem na plenitude, capaz de afirmar a sua posição
política, os seus objectivos estratégicos, os seus princípios e valores, em quaisquer
situações, quer junto de aliados e amigos, quer perante opositores.
A
Portugalidade tem de encontrar também os seus mecanismos de autodefesa,
tornando mais actuante a CPLP, ganhando capacidade e dimensão no domínio da
Defesa e da Segurança, que lhe permita contribuir para a Paz e Segurança internacionais,
como foi o caso, infelizmente apenas durante seis meses no Líbano, com a
parceria Portugal-Timor, mas principalmente para ultrapassar situações como a
vivida na Guiné-Bissau, evitando que interesses regionais acabem por ditar
soluções unilaterais fora do contexto lusófono.
Temos,
como povo, que encontrar os melhores mecanismos e procedimentos para obter as
melhores soluções e os melhores resultados; diz-nos a História que as melhores
opções estratégicas foram aquelas que fomentaram a coesão e a equidade,
encontrando fundamento nos nossos valores, na nossa identidade e na nossa
consciência nacional.
Repito
aqui aquilo que escrevi no primeiro Editorial da Revista Militar, como
presidente da Direcção: “o futuro Conceito Estratégico de Segurança e Defesa
Nacional deve ser o documento orientador para as diversas Estratégias Gerais,
onde devem constar os Interesses e os Objectivos Nacionais, permanentes e
conjunturais, em função da conjuntura estratégica actual, estudadas as ameaças
e os riscos, que o poder político aceita assumir nesse contexto estratégico,
tendo em vista as potencialidades e vulnerabilidades nacionais, definindo eixos
de acção estratégica para as várias estratégias gerais e ser suficientemente
orientador para que, no caso das Forças Armadas, seja possível identificar quais
as missões a cumprir. Esperemos que, perversamente, não exista a tentação de
elaborar um documento, que sirva para justificar um qualquer modelo
preconcebido, ditado não por uma orientação política esclarecida, mas sim pela
aritmética ou por uma visão economicista”.
Hoje
a Portugalidade tem de se defender e consolidar nas novas fronteiras do
interesse nacional, da língua e da cultura, do património e de uma História
comum, de queixas e de grandes realizações, mas também nas fronteiras
económicas e da segurança cooperativa, nos novos espaços de aplicação do poder
nacional, na terra, no mar, no espaço e no cyber-espaço, tirando partido da
inovação, da investigação e do empreendedorismo.
Esta
Associação tem especiais responsabilidades no estímulo dessa consciência
nacional, no escrutínio das opções estratégicas, quer da sua escolha, quer da
sua adequação e aplicação, quer ainda, do sentido ético das lideranças,
assumindo uma presença atenta e actuante neste debate nacional que urge
conduzir.
Desejo
as maiores felicidades e êxitos à Lista A nesta campanha e eleição que se vai
realizar.
Muito
obrigado pela vossa atenção.
José
Luís Pinto Ramalho
General
Lisboa
09 de Maio de 2012.
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